16 de abril de 2011

Teatro de Sombras no íntimo

O brasileiro procura o alento no calor escaldante das regiões quentes e se apavora durante os apagões nas grandes metrópoles. Não temos tradição da sombra como arte ou registros nos costumes indígenas. O que existe vagando por aqui é uma memória afetiva e de resíduos no inconsciente. Talvez reproduzido por algum colono europeu que, libertando seu cansado espírito infantil, brincou no escuro da noite por alguns instantes, ao lado da chama de uma vela e alguns poucos olhos curiosos. Essa rara memória da sombra existe curiosamente pela ausência da luz.


Antes ou depois da lâmpada elétrica a escuridão sempre foi a grande geradora de sombras deslumbrantes. Idade das cavernas. Condomínios de apartamentos. No campo ou na cidade. Em qualquer lugar ou época a escuridão intimou alguém a produzir luz. Aí surge uma sombra diferente e intrigante. Uma manifestação. No silêncio noturno apareceram as primeiras assombrações, brincadeiras com as mãos, silhuetas, suspense e outras projeções da imaginação infantil. Relato de quem brincou com sombras quando a energia cessou e iluminou uma lembrança remota. Vem a arte das sombras desse clarão do passado. Uma conexão com o inverso de um universo esquecido e muito pessoal. Os donos das sombras é que têm o poder de dar um valor emotivo a elas. Quando se percebe o mistério, seja como espectador ou como ator, algo estranho, no íntimo, acontece.

Alexandre Fávero
Sombrista, diretor, encenador e pesquisador da Cia Teatro Lumbra

Texto criado para o Informativo da Cooperativa de Artistas Oigalê - Porto Alegre/RS

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